terça-feira, 10 de maio de 2011

A felicidade...Enfim.

 Ela era apenas mais uma pessoa entre os 6 bilhões que habitam esse planeta, conhecido como  Terra.  E sempre que olhava por esse ângulo sentia que seus problemas eram pequenos, e logo se resolveriam. Essa lógica, porém, tinha o seu lado deprimente, o que representava a vida dela então, diante desse número gigante.
  Depois idas e vindas ao terapeuta e muita análise. Preferiu aceitar a sua visão melancólica dos fatos, era mais fácil se acomodar, sempre é. Não deixará de viver por isso, só não via as coisas com tanta alegria. No fundo invejava os bobos, eles não precisavam interpretar os fatos, apenas deixavam acontecer.
  Seu maior problema era a falta de perspectiva, não sabia encarar a vida como ela é. Tinha tido uma infância difícil, uma adolescência razoável e a sua vida adulta, esperava ela, não poderia ser pior. Mergulhava de cabeça no trabalho, no estudo e em na nada mais.
  Romance também não era o seu ponto forte, afinal era uma pessoa difícil de conviver. E sempre que pensava nisso, se lembrava de uma passagem da Lispector, "Cada pessoa é um mundo. Cada pessoa tem sua própria chave e a dos outros nada resolve (...)”. Bem, lembrava apenas da parte que lhe interessava. Seu namoro mais recente estava por um triz, ainda que a paciência dele fosse acima da média.
  Os dias corriam normalmente, até a chegada das chuvas em Abril. Detestava tempos chuvosos, tudo era mais complicado, o céu não tinha brilho algum e sempre voltava pra casa molhada, e mais triste do que quando saíra. Nesse espirito trágico em que vivia, sem grandes expectativas de vida, sem mágica alguma no seu cotidiano e quase sem romance, seguia o mesmo fluxo como que por inércia.
  Depois de escovar os dentes quinze vezes, tomar um copo de água gelada, tirar o chinelo de forma simétrica, e deitar paralela ao chão, ouviu sons estranhos. Deduziu que deveria estar realmente cansada, e insistiu em ignorar, mas ouviu de novo, e de novo. Cogitou a possibilidade de estar maluca, não sabia como não tinha surtado ainda, entretanto logo confirmou sua sanidade com o aumento descompassado do barulho.  Tomou coragem e foi averiguar, não parecia estar dentro da sua casa, chovia muito e a cada trovoada ela pulava. 
  Quanto mais se aproximava da porta, mais alto o som ficava, que diabos seria aquilo, pensou.
Não sabia se deveria abrir a porta tão tarde, não era dada a transtornos. Poderia ser um ladrão, ou um bando de gatos. Optou, então, por abrir a porta, ainda que receosa, e foi assim que tudo mudou.
  Algum maluco, só poderia ser maluco ou maldoso, talvez ou dois, poderia largar um bebê, na porta de uma pessoa qualquer, em uma chuva daquelas. Rapidamente colocou o bebê pra dentro, e pegou o telefone, alguém deveria saber como solucionar aquele pequeno problema vivo.
  Sua mãe não atendia. Mas que droga, será que eu ligo para policia, pensava sem saber o que fazer. Logo viu que tinha preocupações maiores, o bebê estava todo molhado e poderia ficar doente, providenciou então um banho quente e uma manta bem macia. E como que por milagre sua mãe retornou.
  De repente a sua casa tinha virado uma zona, mãe, irmã, namorado, e até mesmo o cunhado.
Pelo menos ele era pediatra e tinha certificado a todos de que o bebê estava bem. Sem jeito algum, ela não conseguia fazer a criança dormir com tanto barulho, e escapou de mansinho para o seu quarto. Aqueles momentos foram decisivos, assim como o aquele sorriso sem dentes.
  A policia chegou, o serviço de proteção a crianças também, e o bebê foi embora, talvez pra sempre. E mesmo como o seus parentes enchendo a casa, e ela nunca se sentiu tão só. Finalmente ela sabia o que queria, e pela primeira vez sonhou.
  Tornou publicou o seu desejo de criar aquele pequeno milagre de Abril. Lutou muito anos na Justiça, pensou em desistir por se sentir impotente. Mas o seu namorado não deixou, agora era seu noivo, e persistiram juntos. O bebê agora era uma adorável criança de dois anos, que sabia muito bem quem eram os seus pais de coração, porque eles sempre o visitavam. Por isso nunca se deixou ser chamado de órfão.
  Fazendo uso da mídia, desde a internet até a TV, de muitos advogados e depois de casados, conseguiram a guarda da criança, agora com quatro anos. Ela sabia que estava longe de ser perfeita, mas amou aquele bebê desde o momento em que o viu, e agora todos vivem, em vez de apenas sonhar com a felicidade.

2 comentários:

  1. Achei o texto muito criativo, e com um final surpreendente! Além do conteúdo emocionante.

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  2. Concordo com a Tainá! Acheiii liindooo esse texto! :s

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