sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

A mordida na maçã


O convite surgiu de forma inesperada, ela desejou ser forte para negar, mas é difícil dizer não a um sedutor.  Aquele sorriso de nuvem em dia de outono abria espaço para um som quase inaudível. As palavras sussurradas a atingiram em cheio, me beija, ele pediu.  
Trôpega, ela tentou se afastar. A mocinha sabia que não deveria sacia-lo, mas seu corpo cedeu diante de tamanha audácia. Como um gato ele a agarrou abruptamente, de mão cheia e pegada forte. Ah, leitor! Não pense que ele é algum tipo de vilão por causa disso. Podemos dizer que o rapaz é apenas corajoso.
Ele nem fazia o seu tipo, era tudo que ela pensava. Só que cada toque tinha um sabor diferente. Perigo iminente, arrepio pelo corpo. Ela almejou ser hedonista e cair no discurso ponderado dele. Nossa heroína não quer um par, apenas uma cama.
Sem fricote foi tentar a sorte e gostou dessa capacidade estranha de ser dona de si mesma. Se entregou ao momento, entre uma exclamação e outra, não deixou espaço para o ponto final. Quem disse que prazer por prazer é ruim? De corpo e alma, sem olhar para trás. Ela colocou a consciência para passear e se jogou nos braços dele, servindo seus lábios aquela boca voraz.
O lance durou vinte minutos, poderia ter durado um dia, um mês, um ano. O tempo importa pouco diante da intensidade. De repente, Vinícius de Moraes vez sentido pela primeira vez. Ela riu diante da lembrança ainda recente e acariciou o roxo que tinha na coxa, antes de esconder o estranho souvenir sob a saia. Era sua despedida particular.



segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

Levanta-te e Anda

Aaaaah...

Confesso que hoje acordei com preguiça,
Com preguiça de me vestir e de me maquiar.
Sem entusiasmo ou expectativas.
Simplesmente cansada de esperar.


Entre os sorrisos que ficam presos no canto da boca,
A liberdade procura voz para gritar.
Nos abraços robóticos de todos os dias,
O corpo exausto pede para uma cama retornar.

Confesso que hoje acordei com preguiça,
Com preguiça para tolerar e aturar.
Desabafo sem receio do castigo.
Ah! Quanta gente chata para intubar.

Um mexerico ali, uma briga acolá.
Nem precisa ser vizinho para fofocar
Analisa a sua rotina meu amigo, de lá pra cá.
Será forçado a endossar o que digo,
É preciso ter coragem para despertar!

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

La Bataille

 Completamente frustrada, ela se entregou ao pranto. Não conseguia entender por que
tamanha rejeição, sentia-se de lado, abandona ao relento. As pessoas, de maneira geral,
lhe eram gentis. Mas aquele que detinha seu coração parecia simplesmente não se
importar. Magoada, refletia agora, deitada no seu quarto, e relembrava os momentos
anteriores com um enorme pesar, porém consciente de que não era a única culpada pelo
fracasso daquela noite.
Os gritos eram altos, uma verdadeira escola de samba de críticas e ofensas. Ninguém
tinha razão, e, ao mesmo tempo, ambos sabiam o que poderia consertar a situação. Ah,
orgulho maldito, pensava entre uma lágrima e outra. A briga seguiu noite adentro cada
vez mais voraz, como a navalha que dá a barba o formato perfeito. Ele queria estar
certo, ainda que soubesse de seus defeitos. Ela almejava atenção, ainda que soubesse da
falha expectativa.
Vozes mais grossas e cheias de verdades enchiam o quarto com ardor. Chocado, ele
não podia acreditar no que acabara de ouvir, sentia-se certo de seu afeto. Ela, insegura,
desvelava sua alma e confessava seus medos. Temia perdê-lo, mas desejava ser o seu
único objeto de carinho. Ele não sabia como demonstrar isso, e, na sua cabeça, também
não era preciso. Tolo, não sabe que as mulheres clamam por mimos? Ele e ela, ela
e ele, o embate parecia sem fim, cada vez mais próximos e simultaneamente mais
distantes.
Depois de um terremoto tão violento como esse, nada ficara de pé. Ela tinha, nos
olhos molhados, um fundo de esperança juvenil, adquirida nos livros de romance. Ele
não esboçava reação, parecia querer fugir daquele cubículo, para respirar um ar menos
pesado. Quatro paredes que antes ardiam, sentiam naquele momento a brisa gélida da
Sibéria para a qual foram transportadas.
Desgastados e arrasados, deixaram de lado o amor que diziam sentir e simplesmente
dormiram. Não existe no mundo algo que uma boa noite de sono não cure. Pelo menos
era isso que ela pensava até acordar. O momento passou, e só agora ela se dava conta de
que a bandeira branca deveria ter sido hasteada ao final da noite, entre fervorosos beijos
dos loucos enamorados. Todavia, apenas ela era calor nessa relação, e se deixou apagar.
Só lhe restava digerir sua mágoa e calar-se diante dos passos dele rumo à porta. Ele e
ela, ela e ele, cada vez mais distantes e concomitantemente mais magoados.
E a discussão por que começou? Ele não conseguia lembrar, ela não sabia explicar.
Mas lhe digo, caro leitor, a briga despontou como todas as outras, de outros casais
apaixonados, de outros seres humanos que são distintos em personalidade. Com algo
pequeno, que passaria despercebido, como o olhar estacionado de quem contempla o
nada na companhia do outro, como a palavra ferina dita sem pensar, ou como a mão que
não acariciou. A discussão começou e cresceu, pelo silêncio do que é calado no dia a
dia.